sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A Cartada Indiana dos EUA



Nesta semana, Barack Obama declarou em discurso no parlamento indiano que a Índia deveria fazer parte do Conselho de Segurança da ONU e que o país não era mais uma “potência emergente”, porque já havia emergido. O afago de Obama tem pouca conseqüência prática, mas importa como símbolo. O apoio dos Estados Unidos à Índia é uma guinada relativamente recente na política internacional, da década de 1990 para cá. As duas nações superaram a desconfiança mútua da época da Guerra Fria, basicamente por três razões: o medo da ascensão da China, interesses econômicos e a preocupação com a influência dos fundamentalistas no Paquistão após os atentados de 11 de setembro e a longa guerra no Afeganistão.

Indianos e americanos têm fortes afinidades – democracias multiculturais e a coexistência de um Estado laico com intensos sentimentos religiosos – mas durante muito tempo tiveram relações diplomáticas ruins. A Índia se tornou independente com a agenda externa voltada para o “não-alinhamento”, mas na prática foi bastante próxima à União Soviética e a diversos regimes marxistas no mundo em desenvolvimento. Os Estados Unidos, por sua vez, se tornaram aliados de dois rivais indianos – primeiro, do Paquistão, e na década de 1970, da China.



Índia e China foram à guerra nos anos 60, por uma fronteira mal definida no Himalaia (os chineses venceram, mas a área continua em disputa) e persistem tensões pela repressão comunista aos budistas no Tibete – muitos se exilaram junto aos indianos. As relações econômicas estão excelentes e o amplo fluxo de comércio e investimentos fez com que Pequim e Nova Délhi mantivessem os conflitos em segundo plano. Mas estão lá.

O dinamismo econômico indiano, a partir da década de 1990, também tornou o país importante para os EUA. Muitas empresas americanas terceirizam serviços de tecnologia da informação para firmas na Índia, há uma grande e influente comunidade indiana nos Estados Unidos e um país de um bilhão de habitantes superando a pobreza e ingressando na classe média é um paraíso para comerciantes e investidores.

O elemento mais relevante da aproximação entre os dois países foi a assinatura de um acordo de cooperação nuclear entre ambos, apesar da Índia nunca ter se submetido aos regimes de controle de armas atômicas.

O Paquistão é oficialmente aliado dos Estados Unidos, mas o controle do Estado paquistanês sobre seus territórios montanhosos de fronteira, e sobre parcelas importantes de seus próprios serviços de inteligência e Forças Armadas é tênue. As redes terroristas (Al Qaeda, Talibãs) continuavam ativas no país e realizando ataques contra a OTAN no Afeganistão e atentados de grande porte, como os que atingiram a cidade de Mumbai, o centro da economia indiana. Além da persistência da questão da Cachemira. Com aliados desse tipo, não estranha que o governo americano procure relações mais sólidas com a Índia.

2 comentários:

marcelo l. disse...

Prezado Mauricio,

Ia até colocar essa afirmação que a cartada indiana do obama é uma forma de inaugurar de forma implicita a guerra fria contra a China, há uma tentativa nítida de isola-los ou conte-los em todos os campos pela administração Obama.

Abs

Maurício Santoro disse...

Salve, Marcelo.

As relações entre EUA e China andam complicadas, os dois países têm discordado em quase tudo e a incapacidade de ambos em chegar a acordos tem impedido soluções globais em temas que vão da mudança climática às guerras cambiais.

Abraços