quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Leões e Cordeiros


Robert Redford tem longo e fértil envolvimento com a política. Há muito é um dos principais defensores do cinema independente nos EUA e com freqüência se envolve em projetos que fazem a diferença, como este “Leões e Cordeiros”, que sob sua direção é um dos filmes mais inteligentes e questionadores que vi em muito tempo sobre a política americana.

O filme conta três histórias simultaneamente: um jovem senador republicano em ascensão (Tom Cruise) dá entrevista exclusiva a jornalista veterana (Meryl Streep) com revelações sobre a nova estratégia a ser seguida na guerra do Afeganistão; dois oficiais do Exército executam o plano mas se vêem numa situação desesperadora devido aos azares do combate; um professor universitário (Redford) tenta convencer um estudante promissor, mas relapso, a mudar de atitude – citando o exemplo de brilhante dupla de ex-alunos, justamente os militares em dificuldades na Ásia.

Curioso como a TV americana está colonizando o cinema, no melhor sentido – Leões e Cordeiros deve muito ao excelente seriado The West Wing. Histórias simultâneas, tempo real, diálogos ágeis e o hábito deveras saudável de tratar Todas as opiniões políticas como legítimas e válidas, sem dar sermão no espectador. E fazendo-o parar e pensar.

O senador interpretado por Cruise é uma espécie de Kennedy do Partido Republicano, a face mais jovem que é encarada como possibilidade de renovação. Ele precisa deixar sua marca e aposta suas fichas numa nova estratégia que pode virar o jogo no Afeganistão. Tem relação complexa com a repórter vivida por Streep, que chama sua atenção para os paralelos entre o que ele propõe e o que foi feito na fase final da guerra do Vietnã. Irônica e questionadora, os diálogos entre os dois são espertíssimos:

“Você foi a primeira a me chamar de ´o futuro do Partido Republicano´ “
“Dada a situação atual do seu partido, como você sabe se não foi pejorativo?”
“Porque tive 77% dos votos.”



A seção dos dois militares é a mais fraca, na realidade está no filme como algo que une as outras histórias. O professor de Ciência Política (finalmente o ofício ganhou representação glamourosa, dá-lhe Redford!) lembra do desejo dos dois em assumir um compromisso com a sociedade, em se esforçar para mudar o mundo e usa-os para inquietar o aluno em que ele identifica tanto potencial, mas que está se deixando levar pela apatia e pela preguiça.

O professor discorda da guerra e acha que os dois erraram em se alistar, mas respeita a decisão e admira seu envolvimento. O estudante, em contraste, se diz decepcionado com a política americana e acha que não vale a pena se meter nela, prefere usufruir da alta qualidade de vida que pode desfrutar no padrão confortável da classe média dos EUA. A conversa entre ambos me lembram muito, mas muito mesmo, do que vejo em sala de aula.

O que torna o filme tão interessante é o fato de que as motivações dos personagens são justas, mas eles cometem erros, têm suas pequenas e grandes fraquezas e muitas vezes o resultado de suas ações é bastante diferente da intenção nobre que as inspirou. Ao fim, a questão central de “Leões e Cordeiros” é responsabilidade. Qual o papel que cada um de nós – políticos, jornalistas, acadêmicos, militares, estudantes – temos diante da sociedade. Acima de tudo, o filme de Redford nos faz um apelo: vamos parar por instantes e refletir sobre o que estamos fazendo de nossas vidas, se estamos desenvolvendo ao máximo nosso potencial e contribuindo para que o mundo seja um lugar melhor. Ou, ao menos, para que os piores não triunfem a partir de nossa apatia.

2 comentários:

dra disse...

putz, Maurício!
não vi o filme, mas sua resenha pegou no meu calcanhar de aquiles.
tenho me sentido (e agido) exatamente como o estudante aí. mea culpa, mea culpa...
abs,
drambrosini.blogspot.com

Maurício Santoro disse...

Olá, Dra.

Ouço muitos alunos com dúvidas semelhantes às do rapaz no filme, é um sentimento que está bastante difundido pela sociedade.

Abraços